segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

UMA HISTÓRIA DE NATAL!

Esta poderia ser a história de cada um de vós, esta poderia ser a sua história, leitor, esta poderia ser a história de tanta gente diferente e ao mesmíssimo tempo idêntica; talvez tenha sido a história de muitos de vós, talvez tenha sido a história de alguém, de uma forma ou de outra ocorrida, mas uma história foi, que aconteceu pelo natal e se repetiu por muitos natais!
 
A noite caía a passos largos, aqueles passos de gigante que se dão no céu quando este de azul celeste passa a negro breu! Bandos de cumulus nimbus atravessavam o mesmo, empurrados pelo bramir de ventos ofegantes, quer em força quer em nós, ventos daqueles que anunciam tempestade próxima por cima das nossas cabeças!
 
É véspera de natal!

Eram cinco e trinta da tarde, a iluminação pública ligou-se e antes mesmo deste acontecimento normalíssimo dos tempos modernos e que todos ignoramos com vil desprezo e áspera rudeza, já o autor do blogue do seu modo um tanto ou quanto especial, talvez com alguns laivos de loucura à mistura (que bom ser louco) na solidão da paisagem, apenas acompanhado pelos seus peludos e pelos vendavais vindos de sul, carregando grossas e negras nuvens, desejava a todas as árvores da veiga, a todos os pássaros da veiga, um - Feliz Natal.
 
Não!
Não foi vociferado aos quatro cantos do mundo! Nem tal é necessário! Foi apenas sentido em silêncio, com extrema atenção no olhar poisado em cada árvore, poisado neste e naquele melro, gaio ou gralha que se atreveram a voar céleres roçando a negra farda do autor do blogue, que mesmo ali, lhes endereçou o voto referente à quadra que se está a viver e num sem fim de emoções misturadas entre olhares e pensamentos, rodando o corpo sobre si acabando por deter-se o olhar, nas furiosas águas do Lima, lhe mereceu este, a tremenda consideração em ser felicitado pelo autor do blogue com as mesmas palavras com que felicitou os primeiros!
 
Ali se deteve longos minutos, abanado pelos ventos que corriam com extremo fulgor e o pensamento voou pelos anos e anos e se deteve numa casa feita de grossas paredes de granito da região, numa noite muito especial, mesmo para quem hoje não a ache especial de todo, no centro de uma aldeia, que hoje em dia já nem aldeia é, e lá no seu interior, uma voz grossa, voz de homem, se ouviu, arrastando-se esta agora trinta e três anos depois, pelos negros e modernos pastos da veiga...
 
- Siga, vamos lá, está na hora de rezarmos ao preto!
 
O preto era o Rei Mago Baltasar, figura em destaque, sem menosprezar a Sagrada Família, no presépio que se fazia nessa casa feita de grossas paredes de granito da região, a cada natal que chegava no calendário anual, em que um pai, com carinho e com a preciosa ajuda de dois não menos preciosos filhos, montava o pinheirinho e após a montagem o engalanava com fitas e fitinhas, bolas e bolinhas, luzes e mais luzinhas, para no seu topo colocar a figura do gorducho bonacheirão de vermelho vestido, a figura do Pai Natal. Ali ficava sorrindo, com aquele sorriso somente permitido a tal figura bonacheirona, durante mais de uma quinzena de dias, um sorriso lindo, um sorriso repleto de paz! Um sorriso que cativava os precisos ajudantes.
 
- Pai queres esta bola?
- Não, agora dá-me aquela fita.
- Pai queres esta série de luzes?
- Pode ser, passa aí que ponho já aqui no pinheiro!
 
E assim se ia compondo a composição do pinheiro de Natal. Terminado este, era a vez do presépio e depois do pai ir ao sótão buscar a caixa onde guardava mil mágicas figuras feitas de barro; como será possível numa pequena caixa guardar ao mesmo tempo um moinho, o burro e o moleiro, assim como uma inteira banda de música (?), somente a magia do Natal permite tal acontecimento! Depois dos dois filhos, os tais preciosos ajudantes, não se esqueça o leitor deste facto de suma importância, disporem todas aquelas figurinhas mágicas na mesa de apoio na sala de jantar e depois também de montes, pedras, rio, musgo, muito serrim e a cabaninha estarem dispostos e dispersos pela base de apoio ao presépio realizada em pasta de papel kraft, era tempo da nobre e hercúlea tarefa dos ajudantes preciosos, os dois filhos deste carinhoso pai, passarem ambos entre mãos os mágicos bonecos para que os mesmos viessem a compor o presépio que todos os anos naquela casa de grossas paredes de granito da região, este pai lhes fazia!
 
 
 
 
- Passa-me agora a ponte.
- Toma pai.
- Agora as ovelhas e o pastor.
- Toma pai.
- Agora os Reis Magos.
- Toma...
- Menino Jesus, São José e a Maria. Ahhh...e a manjedoura!
- Lá vão.
- O burro e a vaca.
- Passa o Castelo.
- Aqui está.
- O moinho, o moleiro e o burro.
- O anjo.
- Ó pai, está pronto?
- Não, falta o barqueiro...
- Ahhh o barqueiro...
 
Eram assim as doces vésperas de natal naquela humilde casa feita de grossas paredes de granito da região, onde filhos e pai, partilhavam amor e ternura, aprendendo e ao mesmo tempo brincando aos presépios!
 
Na mágica noite da consoada e depois das barrigas bem cheias de suculento bacalhau cozido acompanhado por não menos suculentas e enormes batatas cozidas cortadas ao meio, regadas com azeite e acompanhadas por vinho para os adultos e sumos ou água para os preciosos ajudantes, os dois filhos do casal, assim como para o primo mais velho, que era como um irmão, ainda hoje em tempos modernos o continua a ser, acarinhado com a carinhosa alcunha de o "Primo Belho", chegava então a repetida hora, repetida porque o autor do blogue já a referiu anteriormente, de rezar ao preto!
 
Enquanto isso as mulheres da família com a desculpa de que iam lavar a loiça e preparar a mesa para a sobremesa, iam num ápice à casa da irmã mais velha, recolhiam as prendas e entravam com elas dentro de casa sem que os dois preciosos ajudantes dessem por ela tal a compenetração com que se detinham rezando ao preto! Enquanto a inocência da idade ajudou, os dois preciosos ajudantes nunca se aperceberam que estes acontecimentos ocorriam sempre próximo da meia-noite, hora mágica em que o Menino Jesus, acompanhado do Pai Natal, desciam pela chaminé e na grossa laje granítica da cozinha tipicamente minhota, depositavam as prendas no sapatinho de cada um dos preciosos ajudantes, ou junto dos mesmos, pois o tamanho de certos presentes impossibilitava que os mesmos coubessem em tão pequeno sapato!
 
Era meia-noite, os preciosos ajudantes nem disso se apercebiam, as mulheres juntavam-se também à restante família para rezarem ao preto, como jocosamente afirmava o tio dos preciosos ajudantes e num súbito alguém fazia soar no velho soalho de tosca madeira daquela terna e doce moradia de grossas paredes de granito da região...
 
TOC TOC TOC TOC
 
- Alto, ouvi barulho! Afirmava o brincalhão tio.
- Eu também ouvi! Afirmava o "Primo Belho", que naquela época ainda era um jovem.
- Já chegaram, é o menino Jesus. Afirmava sempre uma das mulheres.
 
Num ápice se trocava a beleza do presépio pela correria desenfreada em direcção à cozinha onde a velha porta de madeira escondia fabuloso tesouro...
 
- Ena tantas prendas! Afirmavam os preciosos ajudantes.
 
E então ali era o delírio da criançada, abrindo freneticamente os seus presentes! Uma chuva de alegria inundava familiares rostos e o precioso ajudante mais velho, por muitas vezes, ainda teve a inocente audácia de abrir a contra da janela e espreitar o céu, na ânsia de ver a ir embora com presentes para todos os outros meninos do mundo, o trenó, as renas, o Menino Jesus mais o Pai Natal, percorrendo o céu nocturno!

Com tristeza sentida nunca os viu!
 
Com infinita tristeza veio um dia a descobrir que nunca existiram, tinha sido enganado, embora perdoando mais tarde quem enganado o tinha, precisamente o seu carinhoso pai e a sua terna mãe, que souberam incutir e transmitir a estes dois preciosos ajudantes uma "meninice" terna e linda! O verdadeiro espírito de natal!
 
A noite já ia alta quando o autor do blogue despertou deste sonhar acordado em plena Avenida Rio Lima e o ronronar de um automóvel em lenta marcha o fez despertar para a triste realidade dos dias de hoje...
 
O jovem e carinhoso pai está mais velho e doente, a terna mãe está cansada pela luta que tem encetado pela vida do carinhoso pai, o tio engraçado e que gostava de rezar ao preto, está doente e há muito tempo colado a uma cama, a tia, esposa deste tio brincalhão, cansada está, também pelas provações que a vida lhe proporcionou nos últimos anos, o "Primo Belho" casou, sendo ele pai de dois rapagões e tem a cabeça coberta de um branco manto de neve, feito de cabelos, e os dois preciosos ajudantes, seguiram as suas vidas...um, o rapaz, habita a bela e terna (para sempre) Lanheses, o outro, a rapariga, faz vida no estrangeiro e vem sempre quando o trabalho o permite, para junto dos seus pais e do seu irmão...
 
O Natal era tão belo! O Natal é tão belo quando associado à inocência e fundamentalmente quando temos um carinhoso pai que nos mostre ternamente como belo e terno é o Natal!
 
O autor do blogue deixou a veiga entregue a si mesma e seguiu sentido ao iluminado Largo da Feira! Amanhã é Natal e o autor do blogue gostava de voltar a ser o precioso ajudante uma só vez mais que fosse...
 
Sabe-o, tristemente, não o será mais!
 
 
Esta história o autor do blogue, dedica-a a ti Leonel, a ti Mia, a ti Fátima, a ti Rui, a ti Manuel e a ti Teresa...
 
 

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